Dizem-me professores que se dizem mui sérios, que aprender a pintar é apenas aprender a desenhar.
E que aprender a desenhar a sério é o que se obtém pela visão directa, mais chã, da “realidade”.
E dizem-se artistas !
Pura e simplesmente porque dominam a técnica, não a alma da pintura.
A alma não está lá, voa incessante, para além do infinito.
Estas almas são calma$. E nada aprenderam com a necessidade interior de Kandinsky, esse mago da forma e da cor, tão livre como só a natureza.
E imitam talvez o impressionismo, mas apenas a sua impressão, sol nascente e nunca o poente de tal ser.
Realistas, hiper- realistas, aguarelistas, chicanistas, alfarrabistas, alpistas e um pouco surrealistas e muito muito competentes.
O problema talvez esteja aí: onde se quer talento e alento ao vento sem tempo, dá-se em troca competência plena de ciência.
Algum dia alguém me vai ainda explicar o que é isso de “competência” !
. Será saber desenhar sem sonhar ?
. Saber pintalgar sem amar ?
. Saber esculpir sem sentir ?
Para estas almas diluentes, infames e diletantes, o abstracto é demasiado livre.
Não é como uma maçã ou uma modelo vã: não se pode agarrar com um pincel !
Ensinar tal coisa não pode existir !
Se não se vê, se não está ali diante de nossos e vossos mui atentos e atónitos olhos, se não se comprova no olhar não se aprova a pintar !
Porquê ?
Porque…
Não há tela sem capela !
Não há óleo sem colo !
Não há artista sem copista !
Não há luz se a não vejo !
Não há arte sem “aquele sítio” “naquela parte” !
Vejo avião ? – Não.
Vejo uma alma ? – Também não.
Ora… se não vejo, não pinto !
Afinal de contas… É fácil marejar neste mar !
Pintar angústias dá depressão – Ah, não não e não !
Pintar outros mundos ? – Demasiado profundos.
Sonhar outra realidade ? – Para quê, na minha idade ?
De onde sou ? Em que sonho estou ? Para onde vou ?
Se me minto, sinto.
Só acordo nesse soro da verdade feito de tintas e paixões impossíveis.
Então sou, no fundo…
A autêntica realidade.
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