Francisco Capelo

Feb 19, 20202 min

A brutalidade da banalidade

Dizem-me professores que se dizem mui sérios, que aprender a pintar é apenas aprender a desenhar.
 

 
E que aprender a desenhar a sério é o que se obtém pela visão directa, mais chã, da “realidade”.
 

 

 
E dizem-se artistas !
 

 

 
Pura e simplesmente porque dominam a técnica, não a alma da pintura.
 

 
A alma não está lá, voa incessante, para além do infinito.
 

 
Estas almas são calma$. E nada aprenderam com a necessidade interior de Kandinsky, esse mago da forma e da cor, tão livre como só a natureza.
 

 
E imitam talvez o impressionismo, mas apenas a sua impressão, sol nascente e nunca o poente de tal ser.
 

 

 
Realistas, hiper- realistas, aguarelistas, chicanistas, alfarrabistas, alpistas e um pouco surrealistas e muito muito competentes.
 

 
O problema talvez esteja aí: onde se quer talento e alento ao vento sem tempo, dá-se em troca competência plena de ciência.
 

 

 
Algum dia alguém me vai ainda explicar o que é isso de “competência” !
 

 
. Será saber desenhar sem sonhar ?
 

 
. Saber pintalgar sem amar ?
 

 
. Saber esculpir sem sentir ?
 

 

 
Para estas almas diluentes, infames e diletantes, o abstracto é demasiado livre.
 

 
Não é como uma maçã ou uma modelo vã: não se pode agarrar com um pincel !
 

 
Ensinar tal coisa não pode existir !
 

 
Se não se vê, se não está ali diante de nossos e vossos mui atentos e atónitos olhos, se não se comprova no olhar não se aprova a pintar !
 

 

 
Porquê ?
 

 
Porque…
 

 

 
Não há tela sem capela !
 

 
Não há óleo sem colo !
 

 
Não há artista sem copista !
 

 
Não há luz se a não vejo !
 

 
Não há arte sem “aquele sítio” “naquela parte” !
 

 

 
Vejo avião ? – Não.
 

 
Vejo uma alma ? – Também não.
 

 
Ora… se não vejo, não pinto !
 

 
Afinal de contas… É fácil marejar neste mar !
 

 

 
Pintar angústias dá depressão – Ah, não não e não !
 

 
Pintar outros mundos ? – Demasiado profundos.
 

 
Sonhar outra realidade ? – Para quê, na minha idade ?
 

 

 
De onde sou ? Em que sonho estou ? Para onde vou ?
 

 
Se me minto, sinto.
 

 
Só acordo nesse soro da verdade feito de tintas e paixões impossíveis.
 

 
Então sou, no fundo…
 

 

 
A autêntica realidade.
 

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